Mudanças
Passei a manhã num paraíso, mesmo aqui perto, a uns escassos cinco (serão tantos?) quilómetros de Braga. Disse-me alguém ligado à música que, uma vez que vou ensaiar nesse pequeno paraíso, não me posso mais queixar de falta de inspiração. Não concordo. Não entendem, seres não apreciadores de metal, que a inspiração de quem compõe tal estilo musical vem de dentro, do mais profundo dos nossos recantos? Quem compõe metal compõe por catarse, para se libertar de todas as emoções e sentimentos negativos, transpostos para o instrumento ou para as letras. Será que uma verde e luxuriante paisagem minhota serve de musa para quem faz do metal o seu género de eleição? Não. Curta e objectivamente: não. Mas o certo é que, aquando de um intervalo numa tarde de intensa barulheira, sabe bem olhar pela janela e encontrar os montes, a relva, a piscina mesmo por baixo dos olhos...
Toquemos metal.
O problema da paisagem é que, ao deixar-nos contemplá-la, puxa-nos para uma viagem.
Estou ao pinhal.
Levo-te pela mão. Levas o teu vestido negro sobre os teus ombros macios. Os chinelos nos pés fazem-te levitar. Ou quase.
O teu cabelo comprido ondula ao sabor da brisa que nos acolhe. Andamos. As tuas unhas, pintadas de escuro, contrastam com a cor que o coração sugere. Cor-de-rosa, azul, branco, vermelho... Uma cor viva. Ou será preferível uma cor amena, mais romântica, como o verde da paisagem ou o castanho da terra? Que interessa a cor, quando estou frente a frente com o mais belo dos sorrisos, que me inunda o corpo de uma quente sensação de conforto? Beijo-te. Beijas-me. Pegas nas minhas mãos, que fazes deslizar pelo teu corpo abaixo. Páras na anca, que sabes ser esbelta, felina. Conduzes-me pelos teus caminhos, conduzes os meus caminhos. Caímos no chão, despido de subtilezas, coberto de folhas secas que estalam, crepitam, como o fogo que arde já dentro de nós.
Atiras a minha camisola para a terra. Não é mais necessária. Que se lixe o Bart Simpson, dizes tu, sem reparar que está nú e vai provavelmente ficar imensamente sujo e desconfortável. Com os teus olhos de predadora aproximas-te, cobres-me com a tua sombra, primeiro, com o teu corpo, depois. Tocamo-nos com amor. Mais uma vez conduzes-me. Fazes-me acariciar-te, tarefa que cumpro com o maior dos prazeres, enquanto me sinto roubado. Roubas-me à razão. Qual razão? A minha razão é o amor. E a tua? Despimo-nos. Toco-te. Tocas-me. Roubas-me outra vez. Roubas-me um beijo quente, apaixonado, fervilhante, como quem pede mais. E eu quero mais. Queremos mais...
Ouço um acorde composto por um Si com respectivas quinta perfeita e oitava. O mais grave que a guitarra pode debitar. Distorcido. Acordo.
Merda. Agora fiquei com raiva. Quem me fez isto? Acordar-me a meio de um passeio tão prometedor não é de gente... Agora sim, sinto-me capaz de compor um tema cheio de sentimento. Grande cabrão do gajo que pegou na guitarra... Vamos tocar.
Pintelho
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Toquemos metal.
O problema da paisagem é que, ao deixar-nos contemplá-la, puxa-nos para uma viagem.
Estou ao pinhal.
Levo-te pela mão. Levas o teu vestido negro sobre os teus ombros macios. Os chinelos nos pés fazem-te levitar. Ou quase.
O teu cabelo comprido ondula ao sabor da brisa que nos acolhe. Andamos. As tuas unhas, pintadas de escuro, contrastam com a cor que o coração sugere. Cor-de-rosa, azul, branco, vermelho... Uma cor viva. Ou será preferível uma cor amena, mais romântica, como o verde da paisagem ou o castanho da terra? Que interessa a cor, quando estou frente a frente com o mais belo dos sorrisos, que me inunda o corpo de uma quente sensação de conforto? Beijo-te. Beijas-me. Pegas nas minhas mãos, que fazes deslizar pelo teu corpo abaixo. Páras na anca, que sabes ser esbelta, felina. Conduzes-me pelos teus caminhos, conduzes os meus caminhos. Caímos no chão, despido de subtilezas, coberto de folhas secas que estalam, crepitam, como o fogo que arde já dentro de nós.
Atiras a minha camisola para a terra. Não é mais necessária. Que se lixe o Bart Simpson, dizes tu, sem reparar que está nú e vai provavelmente ficar imensamente sujo e desconfortável. Com os teus olhos de predadora aproximas-te, cobres-me com a tua sombra, primeiro, com o teu corpo, depois. Tocamo-nos com amor. Mais uma vez conduzes-me. Fazes-me acariciar-te, tarefa que cumpro com o maior dos prazeres, enquanto me sinto roubado. Roubas-me à razão. Qual razão? A minha razão é o amor. E a tua? Despimo-nos. Toco-te. Tocas-me. Roubas-me outra vez. Roubas-me um beijo quente, apaixonado, fervilhante, como quem pede mais. E eu quero mais. Queremos mais...
Ouço um acorde composto por um Si com respectivas quinta perfeita e oitava. O mais grave que a guitarra pode debitar. Distorcido. Acordo.
Merda. Agora fiquei com raiva. Quem me fez isto? Acordar-me a meio de um passeio tão prometedor não é de gente... Agora sim, sinto-me capaz de compor um tema cheio de sentimento. Grande cabrão do gajo que pegou na guitarra... Vamos tocar.
Pintelho
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