Um blog de todos nós. Afinal, pintelhos todos temos... Uns mais, outros menos...

quinta-feira, fevereiro 10, 2005

Vergonha

É hoje, à segura distância de onze dias do fatídico evento, que ouso comunicar pubicamente o que realmente sucedeu. Sim, porque sucedeu. De facto.
Foi quando as belas enfermeiras (confesso que não eram assim tão belas... Aliás, algumas nem sequer tinham beleza evidente ao primeiro olhar. Mas fica bem para despertar aquele eterno fetiche das enfermeiras nos leitores masculinos e, consequentemente, vender este texto) preparavam o meu corpo - tratado como um objecto, por essa altura - para a intervenção cirúrgica que se aproximava, que gritei.
E gritei porquê, perguntam os curiosos leitores (Se não pergunou porquê, então para o caro leitor, este post terminou aqui. É a punição pela falta de interesse e curiosidade que demonstra para com os meus textos).
Gritei porque vi aproximar-se rapidamente, como uma flecha disparada por um certeiro arqueiro em direcção ao meu braço, indefeso como um recém-nascido abandonado nas ruas, uma lâmina de barbear.
Imaginais certamente que Pintelho que se preze tem fobia a lâminas. Claro que tem. E eu não constituo excepção, de todo.
Claro que o grito lancinante que soltei da minha portentosa garganta teve o efeito desjado - a lâmina imobilizou-se no ar, qual efeito especial de Matrix.
- Calma lá no Brasil que Portugal ainda é nosso! Vossa mercê não crê que um nobre Pintelho permita que o toque com essa lâmina, pois não? - disse eu, numa tentativa clara de enviezar a resposta, ao que a enfermeira respondeu:
- Pintelho? Você? Bãh!
Apercebendo-me do desdém ansiosamente contido naquele "Bãh!", que significava qualquer coisa como "Como é que um gajo como tu pode ser aquele divinal e supremo escritor?", então saquei das credenciais, que é como quem diz, improvisei de imediato uma tese psicanalítica acerca de enfermeiras e seringas e de onde as enfermeiras espetam as seringas. Aí, ela pôs-se de pé atrás. Disse:
- Muito perspicaz, essa análise, mas gostaria de uma prova mais concreta de como é, de facto, o verdadeiro Pintelho que eu todos os dias idolatro, frente ao ecrã do meu computador.
Então, esquecendo-me da discrição que tento manter, de modo a não ser abordado na rua por fãs doidas que gritam histericamente o meu nome enquanto imploram autógrafos nas zonas púbicas, levantei a bata azul, única peça de vestuário que me cobria o corpo, e apresentei a minha assinatura pessoal, que é como quem diz, todo o poderio de pêlos imaculadamente conservados sem chatos que se acumula na minha púbis.
Então, ela rendeu-se. Pediu a todos que saissem da enfermaria, correu a cortina que separava a cama onde eu esperava a intervenção e a de outros espectadores, fãs meus, certamente, e saltou-me para cima. Queria festa com o Pintelho, pensei.
E aconteceu.
Pela segunda ocasião no mesmo dia, gritei.
A maluca da mulher, que nem sequer conhecia este blogue (outra coisa é difícil de esperar), aproveitara o meu devaneio para me rapar os pêlos de braço e mão.
Sim, Pintelhos e Pintelhas deste mundo. Ele está cada dia mais perdido. E eu estou tão ou mais depilado no braço que o José Castelo Branco ou o outro José, o companheiro do Diogo.
Tenham pena de mim.
Estou carente, enquanto sinto falta de meus parentes assassinados em nome de um cirurgião que não gosta de pêlos.
Hoje, como desde esse dia, estou de luto.
Pintelho

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